Ferramentas identificaram que 78% dos ataques a senadores da CPI eram artificiais.
Sem maioria na CPI da Covid, o governo Jair Bolsonaro (sem partido) contava com sua máquina de moer adversários nas redes sociais para intimidar senadores de oposição. Os alvos preferenciais eram o relator Renan Calheiros (MDB-AL), o presidente Omar Aziz (PSD-AM) e o vice, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
Bolsonaro em evento em Brasília — Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino
A primeira ação ostensiva das chamadas milícias digitais foi promover uma campanha no Twitter com a hashtag #renanvagabundo. Mas o tiro saiu pela culatra. Uma ferramenta “caça robôs”, que utiliza Inteligência artificial para identificar contas inautênticas, detectou que até 78% dos ataques eram artificiais, ou seja, partiam de contas que não tinham um ser humano por trás.
É ingenuidade acreditar que todos os ataques aos senadores contrários ao governo partem de robôs. Mas é fato que a tática bolsonarista de manipulação das redes sociais, de fazer uma onda parecer tsunami, está ficando manjada. Até senadores com pouca intimidade com o mundo digital começam a perceber que há algo estranho no ar:
“Rapaz, eu clico no treco e o desgraçado tem um, dois seguidores e tá lá me xingando. Às vezes nem seguidor tem e vem perturbar na minha rede”, explica, a seu jeito, Omar Aziz.
Renan foi o primeiro a perceber o risco que a estratégia bolsonarista apresentava para o G7 e estimulou sua equipe a compartilhar os dados de “caças robos” com outros senadores. A responsável pelo trabalho é a jornalista Izabelle Torres, que desenvolve há dois anos pesquisa acadêmica sobre o comportamento dos robôs no Brasil e a influência deles na opinião pública. O sistema que ajuda a CPI foi desenvolvido com base no trabalho realizado por pesquisadores da Universidade de Indiana. Os padrões brasileiros de uso de rede foram definidos após a análise de 20 mil contas ativas nos últimos anos.
“Posso garantir que, hoje, nenhum dos senadores do G7 se sente intimidado por ataques virtuais”, afirma Randolfe.
Nem sempre foi assim. Antes mesmo da instalação da CPI, o senador Jorge Kajuru pediu arrego ao presidente Jair Bolsonaro numa ligação gravada e divulgada pelo próprio parlamentar. Ao ouvir que Kajuru defendia convocação de governadores, e até de ministros do Supremo, o presidente prometeu retribuir :”Dez para você. Tendo a oportunidade, pode deixar que eu falo com as mídias e cito essa minha conversa contigo, ampla CPI do Covid”. Falar com as mídias é do que trata este artigo.
O filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (sem partido), também gosta de usar a tática de falar com mídias para convencer políticos. Durante o processo de votação da privatização da Cedae, a estatal de águas do estado do Rio, o zero-alguma-coisa (esse blog não decora quem é quem na família) foi acusado pelo presidente da Assembleia Legislativa, André Ceciliano, de ter ameaçado expor nas mídias sociais alguns deputados estaduais que votassem contra os interesses do governo federal.
Se a tendência observada na CPI se consolidar, e o mundo político perder o temor da família falar com as redes, o bolsonarismo perde força.
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