Proposta está na pauta da Comissão de Constituição e Justiça, mas não será votada nesta semana. Atualmente, a Constituição garante gratuidade a todos os estudantes de instituições públicas.
PEC consta da pauta da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara — Foto: Reprodução/JN
Uma proposta de emenda à Constituição (PEC) apresentada na Câmara dos Deputados estabelece a cobrança de mensalidades em universidades públicas brasileiras. Polêmico, o tema enfrenta resistência de partidos de oposição e tem gerado controvérsia nas redes sociais.
A matéria consta da pauta desta terça-feira (24) da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), que é a primeira fase de tramitação. Caberá colegiado analisar apenas questões técnicas. Isto é, se o texto fere algum princípio constitucional para autorizar ou não a sua tramitação.
De autoria do deputado federal General Peternelli (União-SP), a PEC tem parecer favorável pela sua tramitação do relator, deputado Kim Kataguiri (União-SP).
No entanto, Kataguiri informou ao g1 que não será votada nesta semana. Segundo o gabinete parlamentar dele, o deputado estará ausente da Câmara nesta semana e só retornará na próxima. Pelas regras regimentais, o relator deve estar presencialmente na comissão.
Em uma rede social, o relator se defendeu dos ataques argumentando que a proposta prevê a cobrança de mensalidade “só dos mais ricos”.
“Sim, sou a favor de que os ricos paguem mensalidade de Universidades Públicas (mantendo a gratuidade para os pobres). Ou você acha justo que os pobres, que não estão na faculdade e que são os que mais pagam impostos no Brasil, continuem pagando a faculdade dos mais ricos?”, escreveu Kataguiri.
Se aprovada na CCJ, a proposta será, então, encaminhada para uma comissão especial, ainda a ser criada, que terá a responsabilidade de discutir o mérito. Depois, a PEC precisará ainda de duas votações no plenário da Câmara antes de seguir para o Senado.
Entenda o que propõe a PEC 206/2019:
Como é hoje
Atualmente, a gratuidade das universidades públicas é garantida pelo artigo 206 da Constituição Federal, que estabelece a “gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais”.
Assim, nenhum estudante aprovado em universidade pública, independentemente de renda, raça, cor ou gênero, paga mensalidade nestas instituições.
O que prevê o texto
A PEC 206/2019 prevê alterar um trecho da Constituição para estabelecer que as universidades públicas passem a cobrar mensalidades, mas garanta a gratuidade para estudantes que não tiverem recursos suficientes. O corte de renda será definido pelo Poder Executivo e caberá a uma comissão da própria universidade a análise das gratuidades, respeitando os valores estabelecidos. A PEC não detalha como este controle será feito.
Assim, ficaria:
- Artigo 206: gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais, ressalvada a hipótese do art. 207, § 3º;
- Artigo 207, parágrafo 3º: As instituições públicas de ensino superior devem cobrar mensalidades, cujos recursos devem ser geridos para o próprio custeio, garantindo-se a gratuidade àqueles que não tiverem recursos suficientes, mediante comissão de avaliação da própria instituição e respeitados os valores mínimo e máximo definidos pelo órgão ministerial do Poder Executivo.
Como é a tramitação
A primeira etapa da tramitação de uma PEC é a CCJ, que avalia aspectos formais e se a proposta não fere a Constituição, autorizando ou não a sua tramitação. Se for autorizada, uma comissão especial será criada e ficará responsável por debater o mérito da proposta, podendo fazer alterações no texto.
Depois disso, ela terá que ser votada no plenário da Câmara em dois turnos e, caso seja aprovada, segue para o Senado. Se houver mudanças substanciais na proposta, ela volta à Câmara e depois retorna ao Senado. Quando aprovada, a proposta é promulgada em forma de emenda constitucional em sessão do Congresso Nacional.
Os argumentos de quem defende
O General Peternelli, autor da proposição, diz que a PEC não causa prejuízo à educação pública, já que só quem possui condição financeira de pagar as mensalidades arcarão com a cobrança e os que não puderem pagar “continuarão usufruindo da gratuidade”.
“A gratuidade generalizada, que não considera a renda, gera distorções gravíssimas, fazendo com que os estudantes ricos – que obviamente tiveram uma formação mais sólida na educação básica – ocupem as vagas disponíveis no vestibular em detrimento da população mais carente, justamente a que mais precisa da formação superior, para mudar sua história de vida”, escreveu ele na proposta.
O relator Kim Kataguiri também defendeu o texto em uma rede social, onde afirmou que o dinheiro público deveria ser investido nos mais pobres.
“A educação brasileira não pode continuar sendo uma máquina de desigualdade social (tirando dos pobres e dando pros ricos). Precisamos investir na educação básica e ampliar o acesso dos pobres na universidade”, disse.
Os argumentos de quem critica
Um dos partidos que fazem oposição à proposta, o PSB a considera polêmica e possivelmente agrava o problema no ensino superior brasileiro. O partido alerta para o risco de redução de investimento público nas universidades federais, além da falta de critérios específicos que determinem o público alvo da cobrança e como ela seria feita.
“A Constituição Federal tem por princípio a gratuidade do ensino público como instrumento de promoção social, de desenvolvimento humano e científico do país. Criar subgrupos nas universidades, dos alunos que podem pagar e dos alunos que não podem pagar, irá criar ‘castas’ nas universidades, enfraquecendo os estudantes quando da busca por melhores condições de ensino, por exemplo”, defende o partido em nota.
O PSOL também critica o projeto por entender que pode dificultar o acesso de estudantes com menos poder aquisitivo ao ensino superior público, bem como reforça a ideia de que os gastos com educação superior pública são supérfluos.
“O projeto ignora a ampliação de cotas sociais e raciais para o ensino superior, ignora a discussão de políticas públicas a fim de viabilizar a matrícula e permanência de estudantes provenientes das classes sociais mais vulneráveis, buscando apenas criar embaraços para o regular funcionamento das instituições de ensino públicas como, justamente, órgãos públicos”, diz.
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