Áudio cita reunião que ocorreria em 3 de junho na Comunidade São Rafael, local onde Bruno e o jornalista Dom Phillips estiveram no dia em que desapareceram.
O indigenista Bruno Pereira, de óculos. — Foto: Reprodução/Rede Globo
Em um áudio obtido pela TV Globo e a Rede Amazônica, o indigenista Bruno Pereira, desaparecido desde 5 de junho, no Amazonas, denunciou pescadores do Vale do Javari que estavam atirando contra equipes de fiscalização na região.
O áudio (OUÇA ABAIXO) é de maio e, nele, Bruno cita uma reunião que ocorreria em 3 de junho na Comunidade São Rafael, local onde Bruno e o jornalista britânico Dom Phillips estiveram no dia em que desapareceram. O encontro tinha o objetivo de barrar o avanço da pesca ilegal de pirarucu na terra indígena.
“A gente está preparando uma reunião, uma articulação para a Câmara de Vereadores e a Prefeitura [de Atalaia do Norte] na Comunidade São Rafael. […] Os maiores e grandes invasores da terra indígena aí. Eles vão perder o manejo do pirarucu que demorou 10 anos para eles tirarem”, disse Bruno, no áudio.
Áudio de Bruno Pereira, enviado em maio, sobre ameaças por suspensão de pesca de pirarucu
O áudio, obtido com exclusividade pela TV Globo e pela Rede Amazônica, foi divulgado em reportagem na terça-feira (14).
De acordo com o indigenista, os pescadores que atuam ilegalmente atiraram contra equipes de fiscalização.
“São esses caras que estão atirando na equipe, esses caras que atiraram na base. Não só do São Rafael, [do] São Gabriel, os carinhas de Benjamin [Constant] e outros de Atalaia [do Norte]”.
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A reunião prevista para ocorrer no dia 3 de junho não chegou a ser realizada. À TV Globo, a Prefeitura de Atalaia do Norte disse que o prefeito Denis Paiva tinha um compromisso urgente em Manaus. Dois dias depois, Bruno e Dom desapareceram.
No dia 5 de junho, antes de voltar para Atalaia do Norte, Bruno ainda tentou reunir com um líder comunitário conhecido como ‘Churrasco’, para falar sobre a Vigilância Indígena na região. O encontro estava pré-agendado, mas chegando na comunidade, o líder não estava e o indigenista conversou apenas com a mulher de “Churrasco”.
Em seguida, Bruno e Dom seguiram viagem para Atalaia do Norte, e foram vistos pela última vez próximo à comunidade São Gabriel.
Outras ameaças
Bruno já havia relatado a integrantes do Ministério Público Federal (MPF), em abril deste ano, que vinha recebendo ameaças de uma organização criminosa que atua com pesca e caça ilegais na região da Terra Indígena Vale do Javari, no Amazonas.
Segundo o MPF, ainda abril, um plano de ação foi articulado com Polícia Federal (PF) para que os membros da Equipe de Vigilância Indígena da Univaja (EVU) passassem a manter contato direto e em tempo real com as forças policiais, além de que repassar mais informações acerca das irregularidades mapeadas às autoridades, para dar início um investigação formal.
Em dezembro do ano passado, o indigenista participou da elaboração de um projeto para monitorar a região. Na época, ele já advertia sobre o aumento de invasões no Vale do Javari.
“Trabalho lá há 11 anos e nunca vi uma situação tão difícil. Os indígenas dizem que hoje a quantidade de invasões é comparável à do período anterior à demarcação. Por isso é absolutamente necessário que os indígenas busquem suas formas de organização, montando um esquema de monitoramento capaz de frear conflitos violentos”, diz o indigenista Bruno Pereira, coordenador técnico da Univaja para o projeto”, afirmou Pereira.
Linha do tempo
Montagem com fotos do indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips — Foto: TV Globo/Reprodução
- Dia 5/6 (domingo) – Bruno e Phillips foram vistos pela última vez quando chegaram na comunidade São Rafael por volta das 6h. De lá, eles partiram rumo à cidade de Atalaia do Norte, viagem que dura aproximadamente duas horas, mas não chegaram ao destino.
- Dia 7/6 (terça-feira) – a Polícia prendeu Amarildo da Costa de Oliveira, conhecido como “Pelado”. Durante buscas na casa dele, policiais militares encontraram uma porção de droga, além de munição de uso restrito das Forças Armadas. Na ocasião, também foi apreendida a lancha usada por ele. No domingo, dia em que o indigenista e o jornalista desapareceram, ele foi visto por ribeirinhos passando no rio logo atrás da embarcação dos dois, no trajeto entre a comunidade ribeirinha São Rafael e a cidade de Atalaia do Norte.
- Dia 8/6 (quarta-feira) – Uma testemunha ouvida pela Polícia disse que viu Amarildo e uma segunda pessoa na lancha no dia em que a dupla desapareceu.
- Dia 9/6 (quinta-feira) – A prisão temporária dele foi decretada pela Justiça na quinta (9) e amostras do sangue encontrado na lancha foram encaminhadas para Manaus, onde passam por análise.
- Dia 10/6 (sexta-feira) – Equipes que fazem buscas pelo indigenista e pelo jornalista britânico encontraram “material orgânico aparentemente humano”, no rio, próximo ao porto de Atalaia do Norte. De acordo com a nota, divulgada pela Polícia Federal (PF), o material encontrado foi encaminhado para análise pericial pelo Instituto Nacional de Criminalística da PF.
- Dia 12/6 (domingo) – A Polícia Federal encontrou um cartão de saúde com nome de Bruno e outros itens dele e de Dom Phillips. Durante a tarde, os bombeiros disseram ter encontrado uma mochila, um notebook e um par de sandálias na área onde são feitas as buscas pelo jornalista inglês e pelo indigenista no interior do Amazonas. Já os indígenas afirmaram que também encontraram uma nova embarcação na área de buscas.
- Dia 13/6 (segunda-feira) – A mulher do jornalista britânico, Alessandra Sampaio, disse que os corpos dele e do indigenista foram encontrados. Mas, as autoridades que atuam nas buscas, lideradas pela Polícia Federal (PF), não confirmam a informação.
- Dia 14/6 (terça-feira) – A Polícia Civil informou ao g1 que já ouviu nove pessoas no inquérito que investiga os sumiços, sendo oito testemunhas e um suspeito, o “Pelado”. A mulher dele também foi ouvida, mas não quis comentar sobre o caso.
- Em nota encaminhada na noite de terça, a Polícia Federal confirmou a prisão temporária de Oseney da Costa de Oliveira, de 41 anos, conhecido como “Dos Santos”. Ele é irmão de “Pelado” e o segundo suspeito preso por envolvimento no desaparecimento de Dom e Bruno.
- Ainda durante as ações da PF realizadas na terça, um remo e cartuchos de arma de fogo foram apreendidos durante as buscas.
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