Manifestações de Valdemar da Costa Neto – dono do partido de Bolsonaro – e Arthur Lira (PP) ocorrem em meio a articulações de juristas e empresários para divulgar cartas em defesa da democracia e repercussão negativa da reunião do presidente com embaixadores estrangeiros para atacar urnas eletrônicas.
Presidente Jair Bolsonaro, Rodrigo Pacheco e Arthur Lira. — Foto: Antonio Molina/Fotoarena/Estadão Conteúdo
O Centrão tem feito, apesar de tardiamente, acenos públicos de apoio ao sistema eleitoral nos últimos dias. Na prática, o movimento faz parte de um jogo duplo, uma estratégia típica do bloco quando não tem certeza absoluta se apostou no “cavalo certo”: apoia Bolsonaro mas, como existe o dayafter – e eles não sabem se será Lula ou Bolsonaro –, melhor fazer movimentos que indiquem que a interlocução com o “outro lado” não estará interditada em caso de derrota do presidente.
Um desses movimentos aconteceu quando o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, foi ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Edson Fachin, em uma reunião na mesma quarta (27).
Dono do partido pelo qual Bolsonaro vai concorrer à reeleição, Valdemar disse a Fachin – alvo de reiterados ataques do presidente – que confia na Justiça Eleitoral. E mais: que é totalmente contra o voto impresso, uma das bandeiras do presidente.
O objetivo do PL, repete Valdemar a integrantes do Judiciário, é fazer bancada no Congresso. Traduzindo: a prioridade do Centrão é ter poder, como sempre, no Congresso Nacional.
Na quarta, Lula mudou o tom e, pela primeira vez, também acenou a Arthur Lira. Em entrevista ao UOL, disse que quem precisa do presidente da Câmara é o presidente da República – e que o presidente da República não deve interferir na escolha pelo comando da Mesa Diretora.
Lira, nos bastidores, não acredita nessa fala de Lula. Mas, por uma coincidência, também na quarta – após nove dias em silêncio – disse que confia no sistema eletrônico. Lira fez o discurso ao lado de Bolsonaro e dias depois de participar da convenção que oficializou Bolsonaro candidato. No evento do domingo, Lira vestiu a camisa de Bolsonaro. Na quarta, assoprou: fez o discurso de defesa das urnas ao lado de Bolsonaro, que permaneceu olhando para a mesa.
Mas por que esses movimentos acontecem agora?
É consenso na campanha de Bolsonaro que o presidente é o responsável pela “onda errada” que domina o noticiário há semanas: a reunião com embaixadores. A partir dali, as reações de diferentes autoridades, incluindo base do presidente como militar, Abin, PF – reagiram com contundência aos ataques do presidente.
Mais recentemente, aumentou a pressão sobre os que ainda não haviam se posicionado – pois uma articulação por parte de empresários, juristas, artistas e outras personalidades públicas, em torno de cartas de apoio à democracia, conseguiu a adesão de 230 mil assinaturas e conta com nomes de peso do mercado como Walter Schalka, Roberto Setúbal, Pérsio Árida, entre outros.
Uma segunda é pilotada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) – que, na gestão Paulo Skaf, apoiou o impeachment de Dilma Rousseff (PT) – e que conta com o apoio da Federação Brasileira de Bancos (Febraban). O comitê de campanha de Bolsonaro sentiu tanto o manifesto que prepara, como resposta, outros documentos de apoio ao combate a corrupção e contra a inflação.
O Centrão, como gosta de lembrar um de seus principais caciques, apoia o mandatário – mas desde que haja reciprocidade. Na política, isso significa conseguir acesso ao poder ilimitado por meio de verbas, cargos, espaços e pautas.
“Se o presidente da República adotar um voo solo, numa agenda que coloque em risco o projeto de poder conjunto com Centrão, o Centrão pode até ver o barco afundar, mas ele sabe nadar”, ironiza esse líder do bloco. Ou seja, o Centrão pode não desembarcar do apoio antes – mas, durante o processo eleitoral, pode construir pontes e amarrar acessos para pular do barco no dia seguinte do pleito.
Militares
Há, ainda, o impacto negativo do evento promovido por Bolsonaro para atacar o sistema eleitoral brasileiro diante de uma plateia de embaixadores estrangeiros, realizado apesar da orientação em contrário do Centrão.
Também na quarta, o presidente do Superior Tribunal Militar (STM), que estava no encontro – para o qual os comandantes das Forças Armadas recusaram os convites do Planalto –, declarou na quarta-feira que os militares não têm que se envolver nas eleições.
Nos bastidores, integrantes da cúpula do Exército reafirmam que não há endosso nem apoio a qualquer aventura de Bolsonaro – mas sabem que o presidente continuará a tentar arrastá-los para o tumulto.
Por isso, nas análises de praxe feitas por esses militares sobre as eleições, eles consideram todos os cenários, desde tranquilidade até falência dos sistemas de segurança pública estaduais – o que bolsonaristas gostariam que acontecesse.
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